Steven Spielberg homenageia a família e o cinema no autobiográfico Os Fabelmans – FILMES, por Rudney Flores

 em Colunistas, Cultura, Rudney Flores

A temporada de filmes do Oscar 2023 se inicia nas salas brasileiras nesta semana com a estreia de Os Fabelmans, novo filme do consagrado diretor Steven Spielberg, cotado para várias indicações à premiação da Academia de Hollywood. Assim como fizeram recentemente Alfonso Cuarón com Roma, Kenneth Branagh com Belfast, James Gray com Armageddon Time e Alejandro González Iñárritu com Bardo, Falsa Crônica de Algumas Verdades, Spieberg é mais um cineasta a visitar suas origens, fazendo uma homenagem apaixonada à família e também à sétima arte, um projeto muito sentimental para ele.

A produção começa em 1952, quando o casal Fabelman (pronuncia-se “feibelman”), Burt (Paul Dano, o vilão Charada do mais recente Batman) e Mitzi (Michelle Williams, indicada quatro vezes ao Oscar) leva o pequeno Sammy – o alter ego de Spielberg – para ver no cinema O Maior Espetáculo da Terra, grandiosa produção do diretor Cecil B. DeMille. Uma cena em particular assombra e marca o garoto, de um grande acidente com trens, despertando nele a primeira fagulha do futuro cineasta.

O momento é percebido pela mãe, uma pianista de talento que abandonou uma carreira que poderia ser promissora para formar família. Ela ajuda o menino a recriar a cena em casa, filmando-a. A partir disso, a câmera de filmagem vai se tornar uma extensão de Sammy –  vivido por Mateo Zoryan quando criança e por Gabriel LaBelle quando jovem –, que começa a produzir seus filmes ainda pequeno em casa, ao lado das três irmãs.

A primeira parte do filme é solar, e retrata uma família harmoniosa – que ainda destaca o tio postiço Bennie (Seth Rogen, de Ligeiramente Grávidos) –, a qual vai evoluindo economicamente à medida que Burt, um inteligente engenheiro, vai desenvolvendo sua carreira na ainda pouco explorada área de computadores, o que faz com que mude de cidade em busca de empregos melhores. No período, o jovem Sammy continua desenvolvendo seus filmes, produções que vão crescendo de tamanho – e que já mostram algumas das influências do diretor que se tornará.

Há um contraponto entre a arte, representada por Mitzi, e o lado racional de Burt que vai marcar boa parte da trajetória do rapaz. O pai considera os filmes do filho apenas um hobby e quer que ele faça uma universidade, enquanto a mãe o apoia em seu sonho de cinema.

Mas uma grande revelação, percebida em uma bela cena quando Sammy monta um filme familiar, altera todo o andamento da trama, que passa a ser, em sua segunda parte, um drama familiar bem ao estilo de vários que marcaram a cinematografia de Spielberg, desvendando de onde vieram algumas de suas inspirações para alguns enredos. O diretor judeu também destaca nessa sequência o antissemitismo e o bullying sofridos na época de colégio em Los Angeles, no estado da Califórnia, para onde se mudaram depois de passar anos em Phoenix, no Arizona.

O primeiro destaque dessa autobiografia, claro, é a paixão de Spielberg pelo cinema. Ele mostra como desde cedo a arte de fazer filmes o fascinou, a criação de um roteiro, a filmagem e a montagem, uma obra de um verdadeiro artesão – técnicas simples, como a de furar com alfinete a película para representar o estampido de um tiro na tela são apresentadas, algo que era muito intuitivo, ao contrário de toda a tecnologia que hoje em dia envolve uma filmagem. São algumas cenas emocionantes, que mostram a formação de um cineasta que hoje tem seu nome marcado na história da arte que representa.

Entre os atores, ótimos trabalhos de Gabriel LaBelle e Michelle Williams, mas é Paul Dano – um ator que merece há tempos um grande papel como protagonista em uma produção de destaque – que sobressai como o marido totalmente devotado à esposa, mas um tanto distante dos filhos, e que se dedica muito ao trabalho, como boa parte dos provedores da casa na época.

Também vale ressaltar duas participações especiais: a de Judd Hirsch (Independence Day) como um tio-avô de Sammy, que lhe indica, em uma curta visita, que fazer arte nunca será algo fácil, mas muito sofrido; e do cultuado diretor David Lynch (Cidades dos Sonhos), que interpreta o diretor John Ford (O Homem Que Matou o Fascínora), ídolo maior de Spielberg, que lhe dá uma grande dica sobre o fazer cinema.

Os Fabelmans é um filme para ser visto na tela grande, como indica o próprio diretor em rápida abertura que deve passar antes das sessões. O ano de 2022, representou um respiro para as salas de cinema com grandes produções como Top Gun – Maverick e o novo Avatar. E nomes como Spielberg devem ajudar a manter a chama acesa pela telona por mais um tempo. Cotação: Ótimo.

Trailer de Os Fabelmans:

 

A Voz

Detentora de vários recordes no mundo da música – de discos vendidos e de canções número 1 nas paradas de todo o mundo –, a cantora Whitney Houston (1963-2012) é tema da cinebiografia I Wanna Dance with Somebody, mais uma estreia da semana nos cinemas brasileiros. Dirigida por Kasi Lemmons (Fale Comigo), a produção retrata a trajetória da artista desde o canto gospel, ainda jovem, acompanhando a mãe em uma igreja e em shows, até sua precoce morte, aos 48 anos.

Whitney (Naomi Ackie, da terceira temporada da série Master of None), prima das cantoras Dee Dee e Dionne Warwick, além de afilhada da grande Aretha Franklin, se destaca rapidamente no final dos anos 1980, quando é contratada pela gravadora Arista, comandada por Clive Davis (Stanley Tucci, de O Diabo Veste Prada). Sua inacreditável potência vocal chama a atenção do produtor em uma audição de um show em que substitui a mãe (a também cantora Cissy Houston, vivida por Tamara Tunie, de O Voo) – ele logo declara que a jovem será a maior cantora de sua geração, o que é confirmado nos anos seguintes, em que se transforma em uma das maiores intérpretes da história da música pop.

O filme vai enfileirando alguns momentos icônicos e importantes da carreira de Whitney, como a gravação do primeiro videoclipe de sucesso, da música “How Will I Know”; as filmagens de O Guarda-Costas, filme com Kevin Costner, e a consequente gravação do sucesso “I Will Always Love You” (regravação de uma composição de Dolly Parton e tema principal do filme com o grande astro do cinema do início dos anos 1990); uma apresentação no famoso programa de Oprah Winfrey; o lançamento do videoclipe de “It’s Not Right But It’s Okay”; um show na África do Sul logo após a libertação do líder Nelson Mandela; além de uma performance marcante no American Music Awards de 1994. Mas tudo é apresentado de forma protocolar, sem maiores detalhes.

No restante, a produção se revela muito conservadora e respeitosa demais à artista, com uma trama que não avança muito em temas polêmicos de sua vida. Ainda jovem, Whitney sai de casa para morar com a amiga Robyn Crawford (Nafessa Williams, da série Raio Negro), com quem teve um caso lésbico. A relação amorosa – que durou até a cantora começar a fazer sucesso e ter medo de vê-la explorada pela mídia – não é revelada em sua totalidade, a não ser por um rápido beijo do casal.

A cantora também abusou das drogas por anos – o que prejudicou muito a sua voz com o passar do tempo –, assim como teve uma relação para lá de conturbada com o marido e também cantor Bobby Brown (Ashton Sanders, de Moonlight – Sob a Luz do Luar). Mas em nenhum momento do filme há alguma cena da artista consumindo diretamente algum tipo de droga ilícita, assim como o pesado histórico de agressões do marido quase não é apresentado. Dessa forma, os maiores conflitos da história de Whitney – já apresentados em várias biografias e documentários – nunca são explorados totalmente.

O roteirista Anthony McCarten parece não ter tido total liberdade de trabalho, assim como aconteceu em outra cinebiografia que escreveu, Bohemian Rapsody, que retrata a vida do astro Freddy Mercury e tem vários erros de fatos históricos, além de pouco explorar a vida libertina do vocalista do Queen.

Naomi Ackie tem o único brilho em I Wanna Dance with Somebody e faz um competente trabalho de dublagem de Whitney – ela chega a cantar de verdade rapidamente em algumas sequências, revelando ótima voz, mas seria injusto que se pedisse que fizesse o quase impossível, de alcançar o nível vocal do ícone da música que interpreta.

Um dos poucos destaques do filme é uma breve e melancólica sequência, que imagina os últimos momentos de Houston no hotel em que morreu – ela tinha problemas cardíacos, consumiu drogas e acabou morrendo afogada acidentalmente na banheira do quarto, antes de uma apresentação em uma festa pré-Grammy de 2012, promovida por Clive Davis. Cotação: Regular.

Trailer de I Wanna Dance with Somebody – A História de Whitney Houston:

 

Outras estreias

Novo filme de ação do diretor inglês Guy Ritchie (Snatch – Porcos e Diamantes, Sherlock Holmes), Esquema de Risco – Operação Fortune mira na pura diversão na história do espião Orson Fortune (Jason Statham, das franquias Velozes & Furiosos e Os Mercenários, entre outras), enfrentando o vilão bilionário Greg Simmonds (Hugh Grant, de Um Lugar Chamado Notting Hill), que pretende dominar o mundo.

Simmonds quer comprar uma nova tecnologia de armas mortais e Fortune vai tentar impedi-lo com a ajuda de Danny Francesco (Josh Hartnett, de 30 Dias de Noite), um ator hollywoodiano.

Trailer de Esquema de Risco – Operação Fortune:

 

Famoso pelos divertidos esquetes na televisão, como na recente Copa do Mundo, o comediante Marcelo Adnet (franquia Os Penetras) investe novamente no cinema na comédia Nas Ondas da Fé, do diretor Felipe Joffily (E Aí… Comeu?). Ele interpreta Hickson, homem de muita fé que batalha muito para pagar as contas todo mês.

Especialista em informática, Hickson vai fazer um serviço em uma rádio evangélica e acaba fazendo uma brincadeira no microfone, fingindo ser um pastor de igreja e pedindo contribuições, sem saber que estava ao vivo. Mas a audiência gosta dele e o dono da rádio o transforma em um pastor de verdade para arrecadar muito dinheiro.

Trailer de Nas Ondas da Fé:

 

A diretora e roteirista austríaca Marie Kreutzer destaca uma ficção sobre um período da vida da rainha Elizabeth da Áustria (1837-1898) em Corsage, filme que estreia apenas no Cineplex Batel.

Na trama, a nobre conhecida também como Sissi (Vicky Krieps, de Trama Fantasma), sempre idolatrada por sua beleza, chega aos 40 anos e é oficialmente considerada velha. Mas ela não aceitará essa condição e vai lutar para manter sua imagem pública.

Trailer de Consarge:

 

O filme de terror em destaque na semana é Olhos Famintos – Renascimento, do pouco conhecido diretor Timo Vuorensola. Na história, o mito urbano The Creeper retorna após 23 anos e começa a atormentar a vida da jovem Laine (Sydney Craven).

Trailer de Olhos Famintos – Renascimento:

 

Crédito da foto: Divulgação/Universal Pictures

 

Rudney Flores é jornalista formado pela PUCPR, assessor de imprensa e crítico de cinema, com resenhas publicadas nos jornais Gazeta do Povo e Jornal do Brasil.

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