Lázaro Ramos estreia na direção de cinema com Medida Provisória – FILMES, por Rudney Flores.

 em Colunistas, Cultura, Rudney Flores

Um dos maiores artistas brasileiros das últimas décadas, o ator Lázaro Ramos marca sua estreia como diretor de cinema com Medida Provisória, um dos principais lançamentos da semana nos cinemas brasileiros. A produção, filmada antes da pandemia, teve muitas dificuldades para ser lançada por sua temática, passando por vários boicotes do atual governo federal.

Adaptação da peça teatral Namíbia, Não!, de Aldri Anunciação, lançada em 2011, o longa-metragem tem como tema central o racismo, descrevendo uma situação extrema em um futuro distópico no Brasil. Em um tempo em que os pretos são identificados como pessoas de “melanina acentuada”, o governo brasileiro decide baixar uma medida provisória que obriga essa população a voltar para África, como uma maluca reparação pela escravidão que foi perpetuada no Brasil no século 19. Inicialmente, é alegado que viajaria quem quisesse, mas logo os negros começam a ser caçados nas ruas para serem enviados ao outro continente.

Uma resistência é criada através dos chamados afrobunkers, que remetem aos quilombos mantidos pelos antigos escravos, nos quais as pessoas de melanina acentuada acabam se escondendo. Quem também resiste são os primos Antonio Rodrigues – o ator inglês Alfred Enoch, filho de mãe brasileira, e conhecido por atuar na franquia Harry Potter e na série televisiva How to Get Away with Murder – e André, vivido por Seu Jorge (Marighella, Cidade de Deus).  A dupla, que era protagonista única no texto teatral, fica isolada em um apartamento, já que um artigo de lei impede que sejam invadidos domicílios para se retirar os pretos para enviá-los à Africa.

Antonio é advogado e entra com uma ação contra a malfadada medida provisória. Sua esposa, a médica Capitu (Taís Araújo, de O Roubo da Taça), consegue escapar da polícia governamental e se abriga em um afrobunker. Além de falar sobre preconceito, diferenças sociais e fazer crítica política, a história gira em torno da tentativa do casal voltar a se encontrar.

Lázaro Ramos destaca algumas ironias e um pouco de humor, mas, em sua maior parte, Medida Provisória é um filme mais direto, descrevendo o absurdo e o terror de uma situação extremada, mas que, analisando friamente, tem alguns paralelos com a realidade. Em outros tempos, a situação descrita seria considerada totalmente impensável, mas no cenário atual do país e do mundo, faz pensar se não está longe de algo semelhante um dia acontecer.

A trama tem personagens bem definidos, os heróis, já descritos, e vilões caricatos, sendo os principais vividos por Adriana Esteves – Isabel, a burocrata do Ministério da Devolução responsável por aplicar a medida provisória no Rio de Janeiro – e Renata Sorrah – Dona Izildinha, a sórdida vizinha de Antonio.

Essa escolha prejudica o melhor desenvolvimento do filme. O diretor estreante poderia ousar mais e avançar nas sutilezas ou mesmo apresentar situações mais debochadas ou sarcásticas. Mas entende-se a opção de Ramos novamente devido aos tempos atuais, em que é sempre preciso dizer as coisas claramente, sendo muito didático até (parece que ninguém entende mais ironia, é preciso explicar piadas). E as coisas ficam ainda mais complicadas quando se trata de uma questão tão séria e ainda muito longe de ser resolvida no país.

Dessa forma, assim como o recente Marighella, de outro ator iniciante na direção, Wagner Moura – grande parceiro de Ramos em diversos projetos, e que também passou por muitas dificuldades para chegar às telas –, tem-se um novo filme que se revela mais importante por sua temática e pelo que representa, suplantando alguns problemas artísticos de produção. Cotação: Bom.

Trailer de Medida Provisória:

 

Os Segredos de Dumbledore

A segunda saga de bruxos criada J. K. Rowling chega ao terceiro capítulo em Animais Fantásticos – Os Segredos de Dumbledore, outra grande estreia da semana no Brasil. A produção é comandada novamente por David Yates, diretor responsável por todos os filmes do universo de fantasia elaborado pela escritora e roteirista desde Harry Potter – A Ordem da Fênix, quinto dos oito filmes do marcante personagem bruxo.

A nova trama confirma o envolvimento amoroso entre o poderoso bruxo Dumbledore (Jude Law, de Closer – Perto de Mais) e o grande vilão da franquia Grindelwald (Makks Mikkelsen, de Druk – Mais uma Rodada, substituindo Johnny Depp, que defendeu o personagem nos dois primeiros filmes). Os dois fizeram um pacto de sangue quando jovens e apaixonados e, por conta desse acordo, Dumbledore não pode agir diretamente contra sua antiga paixão, que pretende tomar o poder do mundo mágico e, por consequência, abrir guerra contra os humanos normais, conhecidos como Trouxas nas franquias.

Então, para enfrentá-lo, ele recruta o magizoologista Newt Scamander (Eddie Redmayne, Oscar de melhor ator por A Teoria de Tudo), protagonista da série, seu irmão Thesus (Callum Turner) e sua ajudante Bundy (Victoria Yates), a professora Lally Hicks (Jessica Williams), o bruxo Yusuf Kama (William Nadylam) e o padeiro e trouxa Kowalski (Dan Floger). Todos fazem parte de um plano maior de Dumbledore para impedir que Grindelwald chegue ao poder em uma grande eleição que haverá no mundo dos bruxos.

Neste embate eleitoral, na qual o vilão aparece como uma espécie de Hitler, carismático na comunidade e prometendo ações totalitaristas, também participa a personagem Vicência Santos, vivida pela atriz Maria Fernanda Cândido, uma das postulantes ao comando superior dos bruxos – a brasileira tem poucas cenas e apenas duas falas, mas participa do ápice da produção.

Do lado do mal, ainda se destaca Credence Barebone – Ezra Miller, o herói Flash dos recentes filmes da DC, que tem se metido em diversas confusões na vida real e pode estar ameaçando a sequência de sua carreira –, personagem que tem revelada uma grande ligação com os Dumbledore.

Mesmo atingindo a terceira parte, a franquia segue sem responder o motivo de sua existência, a não ser o financeiro. A trama até toma um caminho mais sóbrio com Mikkelsen, que dá a Grindelwald um tom menos excêntrico e espalhafatoso (marcas de sempre no trabalho de Depp, dispensado da terceira produção por seu envolvimento no rumoroso caso de violência contra sua ex-esposa, a atriz Amber Heard). Mas, novamente, o que se vê na tela é completamente desinteressante, principalmente se comparado a Harry Potter, a franquia original do universo em que se insere Animais Fantásticos.

Como destaque, a nova produção tem apenas as ótimas sequências de magia, realizadas com sensacionais efeitos visuais. Entre os atores, novamente quem se sobressai é Floger, que continua como o alívio cômico da franquia. Já Law e Mikkelsen não têm muito mais a fazer com os papéis que lhe cabem – ainda mais que o maior desenvolvimento da história do romance de seus personagens é praticamente impossível em uma franquia hollywoodiana destinada a toda família. E, como pretenso protagonista, Redmayne mantém sua total falta de carisma.

Foram programados cinco filmes da saga, mas, da maneira que a franquia está seguindo, não será surpreendente se tudo acabar no quarto capítulo. Cotação: Regular.

Trailer de Animais Fantásticos – Os Segredos de Dumbledore:

 

Programação diferenciada

Com o fechamento definitivo do Espaço Itaú e sem previsões de retorno do Cineplex Batel, Curitiba tem, no momento, somente o Cine Passeio para os espectadores que gostam de acompanhar uma programação diferenciada e mais diversificada. O espaço cultural da Fundação Cultural de Curitiba (órgão da prefeitura municipal), com a curadoria do cineasta Marcos Jorge e do jornalista e crítico de cinema Marden Machado, destaca filmes de variadas cinematografias, sem deixar de lado os grandes lançamentos.

Nesta semana, além dos principais filmes do circuito (Medida Provisória e Os Segredos de Dumbledore), estão programadas as estreias de quatro produções exclusivas no cinema.

A primeira é o nacional Pajeú, novo filme do diretor cearense Pedro Diógenes, do premiado Estrada para Ythaca. Na trama, uma mulher chamada Maristela (Fátima Muniz) é atormentada por um sonho constante, com uma criatura que emerge das águas do riacho Pajeú.

Para lidar com a situação, ela decide fazer pesquisas sobre o local que já não existe mais. Sonho e realidade se misturam e Maristela vê pessoas próximas sumirem, assim como aconteceu com o Pajeú. Seu temor é que também ela própria acabe desaparecendo.

Trailer de Pajeú:

 

O filme francês Caixa Preta, do diretor Yann Gozlan, acabou adiado para esta semana, após um problema técnico em uma das salas do Cine Passeio. A produção de suspense tem como personagem central Mathieu Vasseur (Pierre Niney, de Frantz e Yves Saint Laurent), técnico encarregado de investigar o acidente de um voo entre Dubai e Paris, que matou 300 pessoas.

Conhecido por identificar pontos cegos nesse tipo de tragédia, ele desconfia que as caixas-pretas – equipamento responsável pela gravação de todas as ações na cabine de pilotos – tenham sido adulteradas e parte para uma investigação minuciosa. Mas, para encontrar a verdade, ele sofrerá muitas pressões e encontrará vários desafios.

Trailer de Caixa Preta:

 

Além da participação no novo filme da franquia Animais Fantásticos, a atriz Maria Fernanda Cândido também integra o elenco de O Traidor, mais recente trabalho do cineasta italiano Marco Bellocchio (Vincere). O filme retrata os momentos mais importantes da vida do mafioso Tommaso Buscetta (Pierfrancesco Favino, de Rush – No Limite da Emoção), muito conhecido no Brasil, país para onde fugiu na década de 1980, após uma guerra entre os chefes da máfia siciliana.

Após ser preso em terras brasileiras e deportado para a Itália, Tommaso decide colaborar com o famoso juiz Giovanni Falcone, que combatia os clãs mafiosos no país da bota.

Trailer de O Traidor:

 

A produção franco-belga Lola e o Mar, do diretor Laurent Micheli, apresenta a história de uma jovem trans que perde a mãe que sempre a apoiou quanto à sua sexualidade. Para cumprir os desejos maternos pós morte, Lola (a estreante Mya Bollaers) acaba se encontrando com o pai Philippe (Benoît Magimel, de A Professora de Piano), sempre distante e que nunca aceitou sua condição. De posse das cinzas da falecida, ambos embarcam em uma viagem para o Mar do Norte que poderá mudar suas vidas.

Trailer de Lola e o Mar:

 

Crédito da foto: Divulgação/Elo Company

 

Rudney Flores é jornalista formado pela PUCPR, assessor de imprensa e crítico de cinema, com resenhas publicadas nos jornais Gazeta do Povo e Jornal do Brasil.

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